Tenho conhecido pessoas exóticas, simples, desonestas. É só sair de casa que elas aparecem. Mas confesso que nenhum outro grupo até hoje me pareceu mais peculiar nos seus comportamentos e modos mentais do que o das "pessoas de sucesso" (chamemos-lhes assim). Todas as "pessoas de sucesso" que tenho encontrado apresentam características comuns. Escrevo esta crónica como contributo para o seu estudo. Eminentes sociólogos americanos têm chamado a atenção para aquilo a que chamam "democratização do elitismo". Nos dias que correm, qualquer um pode ser elitista, qualquer um se sente titulado para exibir perante os outros (os "falhados") a sua granítica confiança e o seu maravilhoso "sucesso". Portugal, um país de muitos insucessos, tem assistido a uma expansão das pessoas "de sucesso".
Esclareço que não tenho nada contra o sucesso. Quem no seu perfeito juízo hesitará um segundo na escolha entre ganhar e perder? Existe um certo romantismo no fracasso e na decadência, como uma simples visita aos clássicos pode confirmar. Os perdedores da História podem ser mais interessantes do que os ganhadores. Tal como os anarquistas espanhóis diziam que "se há governo, estou contra", também podemos dizer que "se alguém venceu, estou contra". Mas, tirando casos patológicos, a verdade é que o ser humano aspira naturalmente a ser reconhecido, deseja um estatuto, luta por uma ambição. Quer sucesso.
Só que o sucesso não é condição suficiente para se ser uma "pessoa de sucesso". "As pessoas de sucesso" falam um código próprio, usam uma linguagem reconhecível, demonstram uma atitude. Para sermos reconhecidos como "pessoas de sucesso", precisamos de conviver com outras "pessoas de sucesso". A primeira decisão de uma "pessoa de sucesso" é livrar-se de todos os desgraçados à sua volta. Depois, "a pessoa de sucesso" fala abundantemente do seu sucesso, de como o merece e de como nada do que lhe aconteceu foi por acaso. E, muito importante, sempre que pode, "a pessoa de sucesso" escancara na cara dos outros esse estatuto. São um perigo estas "pessoas de sucesso". Uma má influência para as crianças que podem querer nos seus sonhos ser uma "pessoa de sucesso". Vivem em pose permanente. Desprezam quem presumem abaixo deles.
O psicanalista britânico Adam Philips escreveu uma vez, no seu estilo obscuro, que o "sucesso na terapia pode significar falhanço na universidade". O que acho que isto quer dizer é que as "pessoas de sucesso" numas áreas podem ser "pessoas de insucesso" noutras e que a sua satisfação, por isso, acaba por ser fútil e compensatória. E que estamos sempre tão perto do falhanço em tudo o que fazemos que devíamos pensar que o sucesso, por melhor que seja, não é bem o que parece.